À noite, ele passeava pelas ruas estreitas e sombrias da cidade. O leve aroma da maresia trazia de volta os dias de Verão. Era invadido por reminiscências de outros tempos em que podia ser quem quisesse.
Ao fundo, captava uma música estranha e hipnotizante que guiava os seus pensamentos. Sorria, sentindo-se reconfortado com tudo o que tinha. Caminhava lentamente, respirava fundo como se apreendesse cada pormenor do que o rodeava. Ouvia todos os sons, sentia todos os odores, sentia a temperatura dos outros corpos. Era como se pudesse aceder a todo o mundo apenas naquele momento, apenas naquele lugar. Os seus pensamentos eram um conjunto de palavras e de sensações que bailavam na sua cabeça em sinestesias intermináveis.
A Lua lá no alto, tão indiferente, parecia que lhe sorria em cumplicidade. O Céu, negro de tão escuro, cobria toda a cidade, envolvendo-a num gesto de ocaso.
Ele sentava-se, encostava-se para trás e podia ficar ali um sem número de tempo, acedendo a um sem númeno de consciência ilusória de ser.
Essa atitude de sair para a rua à noite podia ser algo frequente, como podia acontecer por mero acaso. O calor subia então pelo corpo, os seus pés quase descalços, a roupa que ia pesando na pele, a respiração que se tornava mais profunda.
O burburinho que se fazia notar, vinha e desaparecia com a mesma rapidez. Por vezes, tentava captar partes de conversas e, observando os que passavam, ficava a tentar adivinhar como seriam as vidas de tais criaturas. Depois, rapidamente se esquecia de tudo e os seus pensamentos saltitavam daqui para ali. Não havia mais ninguém, era um momento só dele. Onde se sentia completo, por não ter de pensar em mais nada.
Ao longe, começava então a surgir a luz desconfortante da realidade e decidia que era hora de voltar. Inspirava profundamente e, no movimento inverso, expelia a noite e acolhia a claridade da vida banal.
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