03 outubro, 2012

Momento


Estou imóvel. Uma tranquilidade habita em mim como há muito não acontecia. O meu corpo nu, coberto de um odor ainda morno, está de costas para o teu. Os teus braços envolvem-me de uma forma estranhamente confortável. Através da janela aberta, sinto a leve brisa que de quando em quando se faz sentir, fazendo lembrar que o mundo lá fora ainda se move. Alheio-me. Neste lusco-fusco que anuncia a aproximação da noite, fito o branco do tecto por onde passam luzes fugidias provenientes dos carros que deslizam sobre a calçada. Os teus dedos passeiam na superfície da minha pele e movem-se em festas mais e mais espaçadas. Deixas-te ir devagar e abandonas-te mesmo ao meu lado. Estás tão colado a mim quanto possível. A tua respiração torna-se mais pesada. Sorrio. Sentes que daqui nenhum mal virá. Isso assusta-te, faz-te duvidar depois de um passado tantas vezes amargo. Aqui e neste preciso momento, sentes a tranquilidade necessária para te deixares levar para outro lado qualquer. Permaneço imóvel. Volto a sentir a brisa que envolve o quarto e atenua o calor húmido dos corpos. Respiro fundo e sinto uma calma imensa. Era mesmo disto que estava a precisar. Descansar um pouco do resto do mundo num momento tão efémero quanto este. Fico assim... só assim a desfrutar a ausência das coisas. Sem sentimentos. Sem compromissos. Dois corpos apenas, abraçados num gesto tão simples. Um gesto que por vezes demora tanto a chegar. Movo-me devagar. Acordas sem saber quanto tempo passou. Ajustamos a posição, tão docemente quanto possível, para não acordar o momento. Libertamo-nos em meios sorrisos e olhares transparentes, despidos de qualquer preconceito. Livre, fecho os olhos e ouço este silêncio que diz tanto...

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