27 maio, 2012

A força de um abraço


Entro no quarto. Olho-te. Nem sei se estás a dormir ainda. Estou com pressa, mas não resisto em deitar-me ao teu lado mais um pouco.
Estás deitado virado para o lado esquerdo, de costas para mim.
Enfio um braço por baixo do teu pescoço e o outro por baixo do teu braço direito. Abraço-te com força e dou-te um beijinho na nuca. Respiro-te.
Sinto a tua respiração suave e agora sei que estás acordado. Os teus dedos entrelaçam-se nos meus num gesto de confirmação. Aninhas-te. 
Ficamos assim durante algum tempo. Só assim.
Não são precisas palavras. A nossa intimidade é maior que isso. Sobrepõe-se a qualquer materialização. Basta-nos o sentir.
Tenho que ir agora. Apertas-me por não quereres que vá. Não preciso de te olhar de frente para perceber que uma lágrima te rasga agora o olhar.
Digo-te apenas: Que este abraço te envolva até ao momento em que me vires de novo.





24 maio, 2012

O outro lado da minha cama

Ontem, ao adormecer, senti a solidão na palma da minha mão vazia.
A tua ausência estava mesmo ali. Queria sentir um entrelaçar de dedos, dar-te um beijo de boa noite e talvez adormecer no conforto do teu abraço.
Mas essa ausência, vincada no vazio do espaço ao meu lado, abria caminho para que eu pudesse ser mais eu. Dava cada vez mais lugar a pensamentos dispersos e cada vez mais difusos. Numa dança estranha, esses pensamentos brincaram às escondidas nos recantos da minha mente. Perderam-se e reencontraram-se de novo, lá... do outro lado dos sonhos. 
Adormeci sem dar por isso. Devagar e tão imperceptivelmente que nem acordei o pesar da tua ausência do outro lado da minha cama.


22 maio, 2012

As palavras certas...


Tento agir sempre da melhor forma e nunca me permito falhar. Habituei-me assim.  Irrepreensível. 
Ao fim do dia e quando só apetece um pouco de sossego, surge uma discussão. Mais uma, igual a tantas outras. Deita-me ao chão.
Procuro conforto. Sem retorno. Parece que os outros também se habituaram à minha falta de falhas. Por isso, repreendem ou condenam quando algo me corre menos bem.
Desisto de tentar ser sempre melhor. Páro um pouco, porque sei que aqui posso ser eu. Aqui sozinha, escondida do mundo, na minha casa, posso baixar as armas e despir a alma.
Utilizo este cantinho para fazer espelhar aquilo que sinto. Pouco me importa se serei julgada. É o meu espaço, no meu tempo. E aqui posso ser o que eu quiser. Então...
... choro. Sinto-me sozinha.
Sinto a tua falta. Sei que só tu terias as palavras certas para mim neste momento. Trarias um copo com água e dirias para eu respirar fundo três vezes. Ouvirias tudo aquilo que tinha para dizer. Levavas por tabela e aguentavas com firmeza e paciência. Só tu me compreenderias. Só tu, na tua forma tão única de ser. Mesmo que não concordasses comigo, estarias ao meu lado. Fingias concordar, porque sabias que era exactamente isso que eu precisaria naquele momento. Mesmo que mais tarde e com mais calma, me fizesses ver as coisas de outra forma. Mas aqui e agora serias a minha melhor amiga. Como aliás sempre foste. Mas não estás mais aqui. E custa tanto...



21 maio, 2012

Dois

A propósito deste texto do Phyxsius e da ideia do MEC sobre o 11, tive uma conversa com o meu Pai em que lhe disse que ainda não tinha percebido o que é melhor. 
Se nos tornarmos num dois, ver a coisa a dois, para construir algo em conjunto, correndo o risco de perder a nossa individualidade, acabando por nos anular como pessoa, mas enaltecendo esse dois. 
Ou se é melhor manter essa individualidade num onze, respeitando também a do outro, conservando o nosso eu e, por conseguinte, o eu por quem o outro se apaixonou e vice versa, mas perdendo o sentido de comunhão.
Obtive a seguinte resposta: "Tu nem sabes o que é bom ser dois. Eu necessitava, e a tua Mãe também, de sermos dois. Mas só conseguimos ser onze. Tornei-me às vezes um dois desconjuntado, singular, individualizado. Hoje acho isso muito mau. Não existe individualidade sem o outro. Quando só havia Adão não se punha o caso. Quando só há um não se põe o caso. E digo... A vida a dois é algo sublime que supera o ser individual".
E com esta me calei...
A verdade é que sempre acreditei no dois. Mas passo a vida a bater com a cabeça na parede. E acho que apenas hoje me apercebi que só existe dois quando ambos querem uma mesma coisa. Caso contrário, surge uma coisa estranha que acaba sempre em lágrimas e corações partidos.

16 maio, 2012

Cry Me A River




Vagueias pelas ruas sem destino. Estás perdida dentro de ti. Decides sair, na procura de ar fresco. Precisas de sentir algo, procuras alguma lucidez.
Nota-se pela tua aparência cuidada que, antes de sair de casa, fizeste um esforço para te “mascarares”. Alteras o teu aspecto para que no fundo ninguém perceba o que realmente sentes. Mas nota-se no teu olhar que alguma coisa te perturbou profundamente. Sente-se que dentro de ti habita uma tristeza imensa. Caminhas com passos firmes como que expulsando os teus demónios, mas parece que vieram para ficar.
O teu cabelo desalinhado, que a todo o custo tentas arranjar, espelha os teus gestos nervosos. Tentas disfarçar e orientas o teu olhar para o horizonte na procura de um conforto qualquer, mas a dor no peito invade-te e sabes que estás a perder a pouca força que ainda tens. Custa-te a respirar.
É altura de deixar de lutar. Sabes que tens que parar um pouco, pois sentes que estás a perder o discernimento e o pensamento está cada vez mais confuso. O corpo fraqueja e impede que te mantenhas erguida. Sentas-te e ficas com o olhar perdido no chão. Nem percebes que começaste a chorar baixinho.
E é aí, nesse preciso momento, que um estranho aparece e te dá a mão...

03 maio, 2012

Porto de Abrigo

(Texto escrito a pedido de uma amiga, no seguimento de várias conversas e desabafos. A história é dela. Minhas são apenas as palavras...)


Achas que estar comigo não é o que queres para ti. Afastas-te. Terminas o estatuto. Já não somos nada um ao outro. Sai-te imediatamente um peso de cima. Sentes-te livre e sentes-te bem assim. Voltas a ser tu próprio e recuperas a tua rotina. Reavês o teu espaço e a tua liberdade.
Agora, fazes o que queres, com quem queres, quando queres. Sem compromissos, sem sentimentos. Uma miscelânia de sensações apenas. Vives assim durante algum tempo. Depois, há um dia em que te fartas. Ficas aborrecido por ser tudo muito monótono, previsível e sem qualquer sentido ou conteúdo. Decides ficar um pouco sozinho. Páras, olhas em volta e tomas consciência que te falta algo. Sentes-te angustiado. Falto eu. Faço-te falta.
Envias-me mensagens improváveis a horas impróprias. Assinalas momentos passados e enalteces o quanto fui importante para ti. Nunca te respondo. Nunca mais o fiz desde o dia em que te disse que me queria afastar. Continuas a insistir em fazer marcar a tua presença. Fazes questão de afirmar que te manténs aí, mesmo que com gestos subtís. Não entendo o porquê dessa atitude.
Eu segui a minha vida e tu seguiste a tua. Estive com outras pessoas, noutros lugares, noutras realidades muito diferentes da que tivemos. Senti-me bem lá. Sei que também fizeste o mesmo. Fazes questão de o mostrar.
Mas continuas a tentar manter uma ligação, mesmo que já não exista nada que nos aproxime. Sentes necessidade de manter esse porto de abrigo.
Nem sei porque continuo a pensar nisto. Talvez pelo simples facto de nunca teres desaparecido por completo.
Não me queres para ti, mas não queres que seja de mais ninguém. Não sabes se gostas mais de mim ou da tua liberdade.
No passado, houve momentos em que me aproximei de ti, porque precisaste realmente de mim (ou apenas de ter alguém ali ao lado) e não me pude negar. Não te pude negar a minha presença. Porque o sentimento ainda existia e ainda pensava que tudo era possível. Mas foi aí, no momento em que me sentiste tua, que já não me quiseste para ti. Tinhas feito a tua conquista. O teu objectivo foi cumprido. Eu já não te servia para nada, pois o desafio tinha acabado. E já não fazia sentido manteres-me ali. Não daquela forma.
Foi cada um para seu lado. Eu aceitei isso e segui em frente. Tu fingiste fazer o mesmo. Na realidade queres manter-me por perto, mas sempre a uma distância confortável. Queres que eu fique ali, disponível, para quando quiseres voltar, para quando te sentires carente e precisares de voltar ao teu porto de abrigo.
Que perfeito que seria, não era? Seria perfeito se fôssemos todos como tu. Sempre máquinas, desprovidos de qualquer sentimento ou emoção. Cumprindo os seus objectivos a cada dia, todos os dias. Apenas com escassos momentos em que poderíamos ser humanos, ter e demonstrar sentimentos. Escassos momentos em que nos esconderíamos do mundo e nos entregaríamos àqueles de quem realmente gostamos e a quem queremos bem. Rendíamo-nos ao toque, ao calor de um corpo. Poderíamos ser nós próprios, retirar as máscaras e amar sem restrições. Mas apenas por escassos momentos. Porque tu não és isso. Tu és aquele que se disfarça todos os dias. Dono e senhor da razão e que olha os outros com desdém. Aquele que gosta de manter as aparências e que julga viver uma vida de boémio. Mas desengana-te, pois não é nada disso.
Eu conheço-te. Conheço-te bem melhor do que tu pensas. E é por isso que não te quero para mim. Desisti de ti em prol de mim própria. Decidi procurar a minha felicidade longe de quem não me ama. Pois, na verdade, nunca amaste ninguém. Talvez por não te amares a ti próprio. Podes dizer que não e negá-lo com todas as tuas forças, mas sabes que essa é a única verdade que tens como certa.
Se não me queres para ti, então afasta-te de vez. Eu já não estou no lugar onde me deixaste. Estou num outro lugar onde jamais irás aceder. Por isso, liberta-te dessa ilusão que não existe, que criaste e que tentas manter.
E mesmo que um dia me queiras de volta, será apenas porque estás sozinho. Pois é assim que vais acabar. Vais olhar em volta e vais perceber que não existem pessoas reais à tua volta e que todos seguiram com as suas vidas menos tu. Hás-de me procurar e eu não existirei mais. Serei apenas uma ideia dentro da tua cabeça, uma sombra no teu coração. Serei apenas alguém que existiu num passado distante. 


"Somebody that you used to know".